Cartas para o amanhã - Fases # 21

Amanhã,
Estou aqui rindo do meu otimismo (ou presunção, quem saberá dizer?). Semana passada tive a audácia de escrever no grupo do Telegram que as coisas estavam meio bagunçadas, mas que nesta semana “tudo voltaria ao normal”. E aqui estou hoje, no dia da publicação da newsletter tentando escrever algo enquanto minha filha brinca que está nadando com sua boia de braço em uma piscina imaginária no meio da sala e solicita minha presença a cada 1 minuto e ainda não são 8hs da manhã.
Me peguei refletindo muito nos últimos dias sobre esse “voltar ao normal”. Acho que nunca lhe contei amanhã, mas este ano resolvi comprar uma Mandala Lunar e acompanhar meus ciclos, o que parecia algo pequeno tem se tornado grande em minha vida, acompanhar meu ciclo me trouxe outra perspectiva sobre a vida, vivemos ciclos, não apenas menstruais. A vida não segue uma linha reta, mas o tempo todo somos cobrados de que haja um fluxo intenso e constante de conteúdo, produtividade, inspiração, disposição física, mental etc.
Seria isso possível? Talvez. Mas a que preço? Afinal, não existe almoço grátis, se estamos o tempo todo lutando contra a ordem natural das coisas, em algum lugar essa conta há de chegar um dia. Fico pensando na quantidade de doenças que seriam evitadas se pudéssemos ter real tempo de descanso, lazer, ócio, se comêssemos os alimentos sazonais e achássemos estranho ter tomate o ano inteiro, se achássemos normal não ter tanta disposição física no inverno e querer correr quilômetros no verão. Se pudéssemos respeitar nosso corpo como um templo sagrado que se modifica conforme as estações e as fases lunares.
Pode até parecer um papo meio hipster, mas tenho visto a importância de olhar para as minhas fases, como o ambiente ao meu redor influencia e como meu corpo me pede mais atenção e generosidade. Estou aprendendo a identificar o que pulsa naquele momento, respeitar quando o silêncio clama minha atenção, escrever sem medo quando as palavras querem sair a todo custo, não responder mensagens no automáticos, as pessoas esperam, acredite.
Além da Mandala, outra fonte poderosa e ao vivo da ciclicidade da vida são as crianças, Isis tem me mostrado que os dias não são iguais, que as semanas são muito variáveis e que os meses se enquadram neste mesmo ritmo. Crianças passam pelo que chamam de saltos de desenvolvimento, momentos em que certos “downloads” ocorrem e o comportamento da criança costuma sofrer mudanças. Isso ocorre desde o dia em que ela nasceu, mas só agora tem me chamado mais atentamente para a reflexão.
Quero escrever, fazer o que tem que ser feito na casa e toda a lista infinita que envolve o cuidado, mas seu comportamento me mostra claramente que a atenção e a pausa se fazem necessárias. Sempre há duas opções, abraçar ou lutar contra, acho que sempre lutei, por mais que o acolhimento acontecesse, sempre fiquei olhando no relógio o momento em que eu poderia “voltar ao normal”. Enxergar isso gera muitos incômodos, muitos. A produtividade sempre foi uma régua de valor na minha vida e o cuidado nunca foi considerado nessa sociedade como algo produtivo, portanto, sinto que não tenho feito nada de útil, ou ao menos digno de ser apresentado ao mundo.
Não parece muito justo né? Foi o que pensei nesses últimos dias, não que não tivesse refletido sobre tudo isso antes, mas acho que certas reflexões se encaixam em determinados momentos na nossa vida, passam despretensiosas algumas vezes e no momento certo decidem estacionar.
Diante de tudo isso, tenho tentado me entregar as necessidades do hoje, que não se encaixam ao “normal” que sempre me foi vendido, mas que me possibilitam viver o melhor que posso com aquilo que tenho (no caso, pouca escrita, muita conexão com uma criança que está a cada dia descobrindo um pouco mais do mundo e oscila entre amar e temer).
Decidi que farei não apenas este trabalho aqui, mas todos os outros no ritmo que me é apresentado pelo universo, sem relutar, sem projetar futuros catastróficos no mundo da escrita, sem prometer coisas que não tenho a menor ideia se vou poder cumprir, sem cobrar de mim aquilo que já sei que não posso dar, mas que insisto em exigir.
A vida é cheia de fases e dentro dessas fases existem ciclos, ninguém vive uma coisa só o tempo todo e, se vive, provavelmente está lutando bravamente contra suas próprias necessidades.
Quero estar inteira nas minhas fases, inclusive nas mais desafiadoras, que requerem um mergulho no agora. Como diz Lulu “Vamos vive tudo que há pra viver, vamos nos permitir”.
Se vou conseguir? Aí já não sei e seguindo minha promessa a mim mesma, não vou prometer resultados milagrosos, mas estou determinada a tentar e hoje em dia acho isso bastante coisa e muitos passos dados na direção do que venho acreditando.
Fases, que eu possa vive-las da melhor forma.
Com curiosidade e afeto,
Ana.

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