Cartas para o amanhã - Me tornar uma pessoa mais egoísta me deixou mais generosa # 25

Jul 15, 2021

Amanhã,

Me tornar uma pessoa mais egoísta me deixou mais generosa!

Espera aí que já explico esta frase que, embora pareça controversa, faz mais sentido do que pode parecer.

Aprendi a duras penas que toda doação tem um custo e, se colocar no final da lista pode ser mais caro do que parece. Vinda de uma criação profundamente cristã, servir o próximo e agradar o outro são “valores” bastante fortes na minha história. O outro precisava estar à frente de mim para que eu pudesse demonstrar meu afeto e por fim, ser querida e amada.

Me ver na contramão desse amor condicionado à minha dedicação tem sido uma grande jornada. Desde que me tornei responsável por outro ser humano que dependia 100% de mim para sobreviver, entendi que seria impossível cuidar do outro sem cuidar primeiro, de mim. As demandas eram tantas, a doação tamanha que eu não conseguia mais encher o potinho alheio com o meu quase vazio.

Comecei a perceber os efeitos do cuidado em mim, para além do físico, a forma como me sentia quando, de algum jeito, me nutria de coisas que me fazem bem. Essa tem sido uma tarefa ainda árdua, nada automática, mas que visivelmente me mostra como se colocar na lista de prioridades pode até parecer egoísmo em alguns momentos, mas é na verdade uma grande fonte de generosidade que pode lhe habitar.

Quem se cuida (em todos os sentidos que a palavra possa exercer) terá alimentado em si sua energia vital. O nutrir é fluxo, preciso ter minhas necessidades básicas e não básicas alimentadas para que esteja bem para acolher e ser morada para o outro. Preciso me ver no espelho, enxergar minhas necessidades, potências e faltas, acolher e abraçar todas juntas para que possa ser mais generosa com o outro.

A gentiliza que venho aprendendo a exercer com o outro tem brotado do quão me vejo imperfeita na minha humanidade, como abraço minhas sombras, limites e mazelas. Me amar mais me deixou mais egoísta e também mais generosa.

Tenho aprendido a pedir meu espaço, dizer nãos que sempre quis dizer mas achava que não era permitido, deixar o outro esperar e buscar não me comparar. É libertador se permitir, porque aprendo que existe o espaço do outro também, que a reciproca deve ser verdadeira e cobrar menos também é cuidado, de si, e das relações que lhe cercam.

Me vejo bem pequena ainda nesse processo, olhar para as sombras, os calos mais doloridos é trabalho de uma vida toda e sinceramente, não estou com pressa. Quero aproveitar as descobertas que tenho feito e aprender com os resultados que minhas novas versões geram, quero fazer alquimia com as mais diversas opções que surgem a cada momento e me descobrir nas novas relações que se formam.

Quero me ver na primeira fileira da minha vida e convidar muitos outros para junto comigo assistir e participar dessa peça chamada minha humanidade, que aceito e deixo que se faça presente.

Com curiosidade e afeto,

Ana.

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