Cartas para o amanhã - Não controlo nem os cabelos brancos que nascem na minha cabeça, pudera a vida # 26

Jul 22, 2021

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Amanhã,

Já lhe contei sonho meu por aqui antes e hoje quero falar sobre um especifico que tive há algumas noites porque por trás de um sonho sempre tem aquela reflexão não é mesmo?

Sonhei que estava em um lugar bastante movimentado, uma espécie de shopping (o que me fez pensar que realmente estou sendo afetada pela falta de aglomeração porque detesto shoppings) acompanhada de algumas pessoas amigas e minha filha, conversávamos sobre a escolha de uma determinada roupa que minha filha queria e neste momento ela desaparece do meu raio de visão, eu saio tranquilamente procurando por ela, como se estivesse tudo sob controle, até que percebo que ela sumiu. Neste momento eu acordei, e bateu o desespero.

Como assim vou terminar um sonho com minha filha desaparecida? Fechei os olhos e me forcei a voltar para o sonho, para que pudesse ter um final feliz. Como ainda estava meio sonolenta entrei em uma espécie de sonho misturado com imaginação e dei ali o final que queria, encontrei minha filha e pude abrir os olhos em paz. Quem nunca tentou manipular o final de um sonho que me julgue, mas acho que isso deve ser algo que acomete muitas pessoas e me peguei em plena 6hs da manhã refletindo o que tudo aquilo dizia sobre mim.

Somos ensinadas (principalmente mulheres) que o controle é a chave para o “sucesso”, que é organizando, mantendo tudo sob nosso crivo que a roda vai girar, mulheres não são mais criteriosas no trabalho, casa, amizades etc por “natureza”, é uma construção social e o controle é o ponto central disso tudo. Diante de tantas tarefas e carga mental, estar com tudo “sob controle” parece ser a melhor opção para que a rotina funcione, que os filhos cresçam saudáveis e a lista infinita de tarefas seja cumprida.

Só que isso tem custo, primeiro porque o controle é uma ilusão, não controlo nem os cabelos brancos que nascem na minha cabeça, pudera a vida, mas ninguém conta isso e nessa, é desgaste diário tentando fazer tudo fluir do jeito planejado e muita frustração quando o planejado não acontece. Segundo que esse “controle” imaginário nos sobrecarrega, tomamos para nós, mulheres, tarefas que deveriam ser divididas e pensadas em conjunto. Acabamos sem perceber passando isso para nossas crianças, seja na cobrança de resultados do que nós planejamos ou no próprio exemplo de como lidamos com as coisas quando elas não saem como esperávamos.

Não é culpa das pessoas ok, trago aqui o campo individual como exemplo do que nos acontece, mas isso é estrutural, uma cultura que cobra de mulheres e homens determinados comportamentos, o que gera implicações (na sua maioria ruins e com consequências devastadoras). Esta reflexão é apenas uma forma de exemplificar como o controle nos domina, mesmo que não seja nosso desejo, é construção árdua, tijolinho por tijolinho abrir mão do controle e não se sentir menos por isso.

Abrir mão desse controle (que traz segurança, por isso é tão atrativo) tem sido um caminho e tanto para mim. Hoje já me vejo não querendo mais ser o centro de muitas coisas que tempos atrás seria impossível eu abrir mão. É devagar o caminho, ainda tento controlar sonhos, então imagine o tamanho do caminho que tenho pela frente, mas não ver mais o controle como algo que quero é para mim uma espécie de rodinhas que, não vai me fazer chegar lá na velocidade da luz, mas vai ajudar a manter o ritmo.

Em frente, sempre em frente.

Com curiosidade e afeto,

Ana.

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