Cartas para o amanhã

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Cartas para o amanhã - O pseudo controle apresentou carta de demissão #39

anamargonato.substack.com

Cartas para o amanhã - O pseudo controle apresentou carta de demissão #39

Cartas enviadas ao amanhã, todas as quintas-feiras.

Ana Margonato
Oct 28, 2021
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Cartas para o amanhã - O pseudo controle apresentou carta de demissão #39

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Um aviso rápido: Para evitar que essas cartas caiam na sua caixa de spam (ou na aba “promoções” do Gmail) basta arrastar essa mensagem para sua inbox. Se não funcionar, tente criar uma regra direcionando todos os envios com meu e-mail e/ou o subject “Cartas para o amanhã” direto para onde você manda os e-mails que você quer ver ou, se preferir, salve o e-mail umcontocontadopormim@gmail.com nos seus contatos. Obrigada pela atenção!

Amanhã,

Segunda-feira. Um dia que por si só já não é lá muito bem visto no mundo proletário. Passei o dia todo envolvida entre tarefas chatas e os cuidados de uma criança que não estava no seu melhor dia. Final de tarde, já com a “agenda” do dia atrasada, fui realizar uma das últimas tarefas do dia, lavar o cabelo da criança, uma tarefa que, ao menos por aqui, é meio que um dos doze trabalhos de Hércules. Convenço, brinco, brinquedos, bacia cheia d’agua, cabelo finalmente ensaboado, segundos depois, chuveiro queimado. Saio para esquentar água, banho à moda antiga é o que teremos. Marido ligando, carro quebrado, precisa de carona. Cachorrinhas alvoroçadas, hora do passeio já atrasado.

Entre reclamações e latidos, olhei para tudo, parei, respirei fundo e fui fazendo, nem devagar, nem correndo, apenas no ritmo que meu corpo me permitia. O banho rolou mais rápido do que esperava e o marido conseguiu carona com um amigo. Depois que finalmente terminei a rotina que por alguns momentos parecia interminável, saí para correr e comecei a rir daquela tarde maluca que, embora tenha tido elementos um tanto quanto peculiares desta vez (exceto o carro quebrado, esse aí já virou clichê aqui, especialmente às segundas) esse tipo de dia maluco acontece muito na vida desta que vos fala e eu raramente lido com eles de forma leve.

Irritada e mau humorada, essas são as principais respostas que tenho no meu corpo quando as coisas saem do pseudo controle que acredito em ter. Fiquei pensando no que tinha acontecido diferente desta vez, acho que não me reconheci ali naquela leveza, na forma como aquela Ana estava resolvendo a situação.  Num misto de curiosidade com desconfiança, comecei a me observar e vi que talvez eu esteja mudando.

É engraçado como a gente às vezes demora para perceber que mudou. Eu demorei bons meses para perceber que a opinião alheia já não me era tão importante assim, quase dois anos para me ver como uma mãe suficientemente boa e, portanto, mais livre para fazer as coisas ao meu modo e ao que me parece, finalmente estou me desprendendo um pouco do controle que sempre fui ensinada a ter de tudo e de todos.

O papo sobre controle é longo, a cultura leva nós mulheres a usar o controle como uma forma de segurança, de validação e valorização de quem somos e o que fazemos. Não que homens não sofram com isso, mas o patriarcado e o capitalismo faz questão de jogar essa batata quente no colo das mulheres, não à toa, somos pejorativamente, chamadas de controladoras e ao mesmo tempo chamadas de preguiçosas e desorganizadas se não estamos a par da rotina da família, no trabalho etc. Como disse, é longa a explicação e não pretendo me delongar aqui, mas o fato é que, dificilmente irá encontrar uma mulher que não esteja presa na roda do controle, se for mãe então, praticamente impossível.

Voltando para minha história, eu sempre me orgulhei de controlar tudo, mesmo que hoje eu saiba que ninguém controla nada, o que sempre fiz foi planejar minuciosamente tudo e contar que desse certo, me irritando profundamente quando não dava. Isso não é controle, isso é tortura, revestida de organização. Não dá para ser feliz organizando tudo o tempo todo. Eu repito isso como um mantra já faz um tempo e acho que agora uma parte minha resolveu ouvir.

O pseudo controle apresentou carta de demissão. E eu, vou aceitar ou vou querer fazer uma nova proposta? Vou lhe desejar boa sorte na sua jornada ou vou tentar convencê-lo que é confortável estar aqui?

Não sei, aprendi que às vezes só querer não é o suficiente, mesmo que seja doloroso admitir. Não vejo razão para mantê-lo ao meu lado, muito menos para manter sua vaga a disposição, mas não sei se hoje tenho todas as ferramentas necessárias para deixa-lo ir e talvez ver tudo desta forma seja eu me libertando um pouquinho mais dele, afinal, é mais uma coisa que admito não dominar. Preciso de tempo e espaço para me apossar de mim e deixar para trás aquilo que não cabe mais.

Que as minhas segundas sejam o que tiver que ser e, se for caos, que eu possa rir e ver para além, o que há nas entrelinhas, o que há nas vírgulas de cada momento, que sempre ficam mais nítidas e mais leve, quando a gente consegue se entregar.

Com curiosidade e afeto,

Ana.

Me conta nos comentários, o pseudo controle já apresentou carta de demissão por ai?

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2 Comments
Marcos Rodrigues
Oct 28, 2021Liked by Ana Margonato

Parabéns pelo adeus ao controle!

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1 reply by Ana Margonato
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