Amanhã,
Já viveu alguma fase da vida em que tudo parece estar em câmera lenta? Algo sempre na iminência de acontecer, mas nada se move do lugar. Junto a isso, um silêncio abissal sempre no ar, como se fizesse coro para que a lentidão seja ouvida em sua inteireza.
A agilidade que antes era uma marca registrada, já não se faz presente a alguns meses. Os dias perderam sua produtividade de modo assustador. As vezes não sei o que fiz com as 24hs que me foram dadas. Simplesmente se foram, sem rastros, sem mais valia que as justifique.
Não posso dizer que acho isso de todo ruim, mas estaria mentindo se dissesse que acho belo. É que eu não conheço essa mulher, lenta. Sempre convivi com uma figura ágil, orgulhosa de fazer três, quatro coisas ao mesmo tempo. Nunca esquecer nada! Sempre tão “perfeitinha” ela.... Conviver com uma figura falha, que confunde data de entrega, que esquece de comprar o sabão, que deixa a roupa para lavar outro dia porque não está afim, que para de escrever para chorar porque as lágrimas se priorizaram diante do caos.
Conviver com esta pessoa, é um desafio. É preciso confiar. E eu confio em estranhos?
O mais intrigante disso tudo, é que essa mulher, que eu não conheço, tem feito as coisas de um jeito diferente. Ela lê diferente, sem pressa, fica tão absorta nas palavras, que parece ver com a boca, come as palavras, mastiga e só depois engole. Ouve as histórias da criança com devoção, cria novos enredos com vontade, cuida, sentindo o cheiro que o cuidado emana quando feito com presença.
Ela sente o vento, respira fundo e ouve o que o grilo tem a dizer. Se emociona ao presenciar o tempo, personificado no branco que se multiplica nos pelos das cachorras que até ontem, eram jovens. Ela toma café sem culpa. Coloca a xícara ao lado do computador, fazendo companhia para a vela roxa que agora acende todos os dias. Diz que é para ritualizar a escrita, mas gosta mesmo é de sentir a música e aprender os passos que as chamas criam ao dançar.
Essa mulher, que eu não conheço, tem me ensinado a enxergar no escuro. Ali, eu a vejo, e começo a me (re)conhecer.
Com curiosidade e afeto,
Ana
Esta série chegou de forma despretensiosa na minha vida, mas ao final do primeiro episódio já tinha ganhado a minha atenção plena.
Este texto da
conversa muito com esta edição das Cartas.Um desejo não necessário, porém justificável.
sendo maravilhosa como sempre.
Ana, que carta!
Eu senti cada palavra sua. Você ecoou tanto do que tenho vivido, obrigada, minha amiga!
Tô encantada pela poesia que essa mulher nova tem dentro de si…
Beijo!
Ai essa mulher. E a de antes. E a que ainda vai existir. Que bom que elas coexistem! ❤️