Amanhã,
Me falta repertório para falar das condições psíquicas que permeiam viver uma vida pandêmica, no Brasil. Sinto que estou em falta com as pessoas que me rodeiam. Assim como sinto que também estão comigo. É coletivo. Um buraco no estômago que a gente vai tentando tapar a todo custo, esperando muitas vezes que o outro vá ser o suficiente. Mas não é.
Não que a gente não queira. Não tente. É que não tem do(ação) no mundo que tape essas crateras existenciais abertas nesses últimos dois anos. Não é culpa minha, sua, da vizinha natureba, do ignóbil que fica sentado na calçada mexendo com as mulheres que passam (tá, talvez esse aí seja culpado). O fato é que, estamos todos tentando. Na maioria das vezes, falhando.
Como bem diz Lenine “a gente espera do mundo e mundo espera de nós”. Às vezes de forma incompatível com a realidade, inclusive. Estamos exaustes. Ouço o coro quase unânime ressoando por todos os lados. Eu queria ter pra te dar. Mas não tenho. E acho que você também não. Acho também que precisamos falar sobre isso.
É estranho dizer, mas está custoso ao extremo ser apoio. Ao menos no meu conceito desta palavra. O casulo me chama. Eu que sempre fui a solícita, seja por natureza ou adestramento social, esta era a Ana que eu conhecia até o pandemônio chegar. Hoje, me vejo sem forças para fazer coisas que antes pareciam não custar nada. Claro que muito aí é revolução. Fui ensinada a agradar, servir. Aprender a dizer não é coisa recente por aqui. Separar tantos fragmentos tem me levado a refletir sobre o que posso realmente oferecer e o que seria justo me pedirem.
Sinto que estamos adentrando em um novo patamar de relações. Onde se exige menos. Não por vontade própria. Mas necessidade. Está custoso manter-se sã e minimamente saudável. Pudera ser base para outros mais. O contato com o outro não é mais o mesmo. As conexões sofreram mutações das quais não vejo retorno no status quo.
A sensação é que estou me distanciando das pessoas. Mas acho mesmo é que estou me afastando de mim. Daquela minha versão pré-pandemia que não cabe mais aqui dentro. O espaço ficou apertado e não me resta outra alternativa senão decretar despejo.
O mundo continua exigindo. Mas estamos aprendendo (ou tentando ao menos) que a demanda está alta demais.
Trago esta reflexão de peito aberto e ouvidos atentos. É um sentimento meu, não necessariamente uma constatação social. A vivência que tem me transpassado e que oscila entre análise e culpa me leva a ver o mundo assim, como um lugar em que as pessoas não estão dando conta de ser muita coisa além de sua própria muleta.
Me conta como você está (você aí que me lê neste momento), está bem?
Fez algum sentido minhas palavras?
Por favor, me conte.
Com curiosidade e afeto,
Ana.