Uma ervilha no meio do feijão #57
Sobre ser diferente nesse mundão doido.
Amanhã,
Escrevi tempo atrás uma crônica para um livro que nem sei se um dia será publicado, mas que por si só teve e provavelmente ainda terá um efeito curativo em mim. “Uma ervilha no meio do feijão”, uma crônica que fala como me sinto desde que me entendo por gente. Diferente. Fora do padrão. Com um olhar para o mundo que na maioria das vezes não se encaixa com os demais.
Acho que nunca me senti pertencendo a algum lugar até o começo da pandemia, quando fiz meu primeiro curso de escrita. O sentimento foi de acolhimento e “essas pessoas falam minha língua”. Senti um quentinho no coração que só se tem quando o ambiente lhe traz o sentimento de que está tudo bem ser você. Tanto que fiz lindas amizades neste e outros cursos que fiz. Sentir-se parte de algo é transformador e reflete nas relações que construímos a partir deste sentimento.
Mas a vida não é um curso de escrita. Ao menos não a minha. Continuo me deparando constantemente (para não dizer todos os dias) com situações que me levam para aquele lugar já conhecido. Ser diferente. A pessoa que é taxada como a criadora de problemas porque questiona tudo, quer dialogar, entender como funciona, se não dá para melhorar.
Às vezes odeio ser assim (confesso aqui bem baixinho para eu não conseguir ouvir). Recebo tantos olhares que me apequenam. É difícil explicar meu posicionamento. Talvez por isso as pessoas não gostem tanto de dialogar. Dá um trabalho do cão mostrar meu ponto de vista, ser empática, pensar no todo e querer que seja algo construtivo, tudo isso, ao mesmo tempo.
Ando meio cansada. De ser eu. Da falta de vontade do mundo de dialogar. Ao tempo que também ando sem vontade de fazer isso. Apatia generalizada? Não sei. Fato é que, ser diferente tem sido mais doído que o normal. Afetado espaços que antes pareciam estar preenchidos com algo além de ansiedade e displicência. A necessidade de batalhas milimétricamente escolhidas se faz urgente.
Ainda ando com a péssima ideia de abraçar coisas que vão além do alcance dos meus braços. Faço no automático. Aquele papo de que a gente tem que dar conta para conseguir algo, lembram? Sabemos todes que não é bem assim que a música toca e que é bem ilusão achar que vai conseguir abraçar efetivamente tudo. Mas vai falar isso para a pessoa que cresceu aprendendo que é preciso ser produtiva para os outros lhe olhem e abram aquele sorriso de aprovação. Aff, haja mudança que dê conta.
Eu sou a ervilha no meio do feijão. Hora até aprecio sentir o gostinho bom que a mistura do caldinho do feijão faz com meu sabor mais adocicado. Misturar as coisas muda muitas caixinhas internas. O que cansa mesmo é ser uma ervilha só. Talvez eu deva olhar com mais cuidado. Tem muita ervilha por aí, eu sei que tem, só não caiu na mesma panela que a minha.
Me conta. Você é ervilha também?
Quer ser minha vizinha?
Com curiosidade e afeto,
Ana.